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Para uma “nova” esquerda?

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Para uma “nova” esquerda? Para uma “nova” esquerda? Para uma “nova” esquerda?

Para uma “nova” esquerda?

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De uma lucidez impressionante, os apontamentos de Rosana Pinheiro-Machado em “Amanhã vai ser maior” (Editora Planeta, 2019) podem até mesmo soar como engajados politicamente (o que são) ou em um lugar de fala enviesado. Não me preocupo com isto quando faço leituras de caráter acadêmico. São nas diferenças que crescemos, que podemos avançar, que fazemos democracia.

Porém, em alguns momentos do livro, a auto-crítica para a esquerda demonstra uma maturidade imensa para quem se coloca como tal. Obviamente que, em geral, não costumam me identificar como um defensor da esquerda. Alguns, inclusive, acham que sou um camaleão. Tenho bom senso e busco, assim, defender pautas que condizem com minha trajetória de vida. Logo, para quem não se enxerga como esquerda – e talvez tampouco como direita, mas também não “isentão” (?), ler algumas falas fez com que me deixasse em choque.

A proposta da autora é uma crítica fundamentada para compreender os motivos pelos quais a esquerda perdeu espaço nas camadas sociais mais populares que, “por afinidade” deveriam abraçar as pautas da esquerda. Nos chamou a atenção: “Velhos clichês e preconceitos, como esse de que o povo brasileiro não sabe votar porque é ignorante e manipulado, sempre voltam à tona” (PINHEIRO-MACHADO, 2019, p.126). De fato, reduzir o insucesso eleitoral à culpa do eleitorado é algo minimamente vexatório, para não dizer outra expressão. O mesmo eleitor que já votou em Lula não pode escolher Bolsonaro? Quer dizer que o caixote das ideologias políticas jamais pode ser penetrado? É um tanto quanto estranho falar disso justamente para quem estuda as humanidades. Ponto para a Rosana.

Outro importante apontamento nos demonstra como a esquerda perdeu espaço nos últimos anos naquilo que a autora chama de limbo político no Brasil (2014 a 2018). Segundo ela, “uma grande parte da esquerda partidária e burocratizada brasileira comete um erro básico: acredita ser, por geração espontânea ou empatia natural, a porta-voz dos interesses dos mais pobres, bem como julga conhecer suas necessidades e estar prepara para representá-los” (p. 126).

Ora, nada mais justo que o próprio cidadão emancipado, sobretudo em uma geração que tende a se acostumar com experiências democráticas, que quer ser vista, ouvida e considerada – seja por intermédio dos bens de consumo, seja no debate político virtual, possa opinar acerca dos diferentes temas. É um tanto quanto “autoritário” acreditar ser locutor de quem tem voz e vez, de quem pode pensar considerando suas próprias ideias.

Por fim, destaco o argumento terrível (que já ouvi diversas vezes), de que “pobre de direita tem que se ferrar mesmo”. Interessante notar que após a eleição de Jair Bolsonaro em 2018, os intelectuais empoderados puderam sim sair do país, enquanto os pobres seguem por aqui, em um argumento da própria autora. Mais do que isso, Rosana Pinheiro-Machado demonstra que “a esquerda, às vezes, corre o risco de ser engolida por sua própria soberba intelectual e nostalgia” (p. 127).

Outro tapa na cara de quem pode se achar superior intelectualmente. Falta sim empatia dos que se consideram como casta superior na sociedade brasileira. Acusá-los de elite intelectual “esquerdista” como os militantes da direita fazem não condiz meu estilo. Mas é preciso que a esquerda desça do salto para, depois, se reinventar. Os velhos discursos do socialismo e do comunismo, muitas vezes elencados pela própria direita no debate contra a esquerda expressam um debate ideológico, a meu ver, ultrapassado. Pautas como a revolução tecnológica e a globalização, na maioria dos casos atreladas ao “maldito capitalismo”, são cotidianas e precisam ser repensadas e consideradas pela própria esquerda. Afinal, “Para não dizer que não falei das flores” já não embala nem mesmo Geraldo Vandré…

Referência bibliográfica

PINHEIRO-MACHADO, Rosana. Amanhã vai ser maior: o que aconteceu com o Brasil e possíveis rotas de fuga para a crise atual. São Paulo: Planeta do Brasil, 2019.

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